domingo, 9 de fevereiro de 2014

Ainda agora, era difícil olhá-lo, sem notar o tom verde cinzento de seus olhos, seu cabelo brilhante, o forte ângulo de seu queixo, sua boca curvada que parecia chamá-la, tentá-la, convidá-la a…
Claire olhou em seus olhos.
O que ele estava pensando? – Perguntou-se a se mesma.
Ela se endireitou e se esticou enquanto ele tirava suas botas, desabotoou seu cinturão, e começou a tirar suas calças, tudo com deliberada tranquilidade.  Isso a irritou, algo que Clarie não tinha era paciência.

- Te apresse -  ela murmurou.

Ele olhou para baixo, com um sorriso insolente no rosto enquanto terminava de tirar as calças.

 - Paciência, minha dama - ele murmurou.

Clarie desejou golpeá-lo outra vez, mas afogou esse impulso.  
Então, sem cerimônia, ele baixou o último objeto.
Seus olhos faiscaram perigosamente.

-E agora o que quer? - Ele perguntou docemente.  - Você gostaria de ver se te cabe?

Se ele queria insultá-la, tinha falhado. Clarie foi se acostumando com o passar dos anos, com os  insultos, ao que ela tinha aprendido a responder, ao princípio com a espada e mais tarde com a indiferença.

- Toma, minha lady -  disse seu companheiro, jogando as  suas e as roupas do seu companheiro aos pés dela.
- Perdoe a meu amigo. É lento mentalmente e muito rápido com a língua. Tirou-nos nossas armas. Tem nossas roupas. Você ganhou. Rogo-lhe, deixe-nos ir em paz.

Rapidamente, ela tomou as roupas do homem insolente e de seu companheiro com sua mão livre, as pondo logo sobre seu ombro. Então saudou os homens com uma breve sacudida de cabeça e se apressou a sair dali.
Clarie estava afastando-se quando o insolente a chamou.

- Esqueceu-se de algo, dama.

Sempre em guarda, ela virou-se com sua espada pronta para atacar. Mas era muito tarde.  Algo passou assobiando perto de sua orelha e se alojou no tronco da árvore ao lado dela. Era uma adaga.
Ela se sobressaltou. A adaga não lhe tinha acertado por uns poucos centímetros. Mas quando ela fixou seus olhos no homem que a jogou, parado ali em aberto desafio, soube logo, que ele tinha tido a intenção de errar. O que era ainda mais ameaçador.
Sua mensagem era clara. Ele podia tê-la matado. Ele simplesmente escolheu não fazê-lo.

Clarie  embainhou sua espada e deu-lhe as costas, se afastando com toda a calma,  com um sorriso no rosto, sabia que o veria novamente e ela gostava de um bom desafio, e sabia que com ele seria uma boa experiência.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Ainda estava escuro, e pelo que via ainda iria demorar pra amanhecer, decidida a relaxar, e confiante que naquelas horas não encontraria ninguém acordado pela cidade, resolve banhar-se no lago de Leiria.
Ao Chegar no lago, Clarie amarra sua égua numa árvore próxima, e começa a despir-se.
Totalmente nua, solta-lhe os cabelos. Em seguida, com a graça de um boto, mergulha nas águas cristalinas.

***

Dick e Colin eram mercenários, e estavam planejando sua viagem logo ao amanhecer quando ouviram ruídos de cascos que ressoavam atraindo suas atenções. Achando que era o patrulheiro da cidade, e como Colin tinha problemas judiciais, resolveram se esconder.
“Por Jáh, que bela visão” – disse Dick. Olhando a delicada figura de cabelos escuros que cruzava o campo verde e se dirigia à lagoa, despindo-se à medida que chegava ali.
Eles estavam agachados, escondidos detrás de uns arbustos, espiando a esplêndida donzela a banhar-se na lagoa.

****
Clarie lançou seu comprido cabelo negro sobre um ombro. Podia sentir os olhos dos intrusos nela, tinha-os sentido por certo tempo.
Não que ela se importasse de ser apanhada banhando-se. Não sentia incomoda ou com vergonha. Como poderia alguém estar envergonhada ou orgulhosa de ter tudo o que as mulheres possuíam? Se um inoportuno moço conseguia observar com equívoca luxúria, não era mais que uma tolice de sua parte.
Clarie passou seus dedos pelos seus cabelos molhados e lançou outro olhar crítico para onde achava que se encontrava os intrusos.
Os olhos cravados nela possivelmente pertencessem a um par de jovens curiosos que nunca tinham visto uma donzela nua. – Assim pensou.
Clarie se meteu debaixo da água, para esfriar sua irritação. Agora emergia subitamente, sacudindo a cabeça e salpicando a água.

*****
Ao lado dele, Dick gemeu, de prazer ou dor, Colin não estava seguro.
Subitamente dando-se conta do significado do gemido, Colin o golpeou no ombro.
- Por que me golpeia?- Dick sussurrou.
- Quer que ela o ouça?

Ambos voltaram seus olhares à lagoa.  Foi quando perceberam que a formosa donzela, não estava mais lá.

-Cadê ela? – Colin perguntou

Atrás dele, a feminina voz disse claramente:

-Aqui.

Colin não se atreveu a vira-se. A espada dela pressionava firmemente contra uma veia que pulsava em sua garganta. Ao lado dele, Dick abriu a boca surpreso, cambaleou e caiu quando quis olhá-la. Se Colin não tivesse  furioso com ele mesmo por ter baixado a guarda, teria se rido com a cena.

- Rapazes, não estão um pouco grandes para andar espiando uma donzela  banhando-se?
- Seu tom era zombador. - Esperava encontrar jovens idiotas aqui, não homens adultos.

Dick, em vez de vir em sua ajuda, estava apoiado sobre seus cotovelos com uma expressão perplexa que comunicava ao mundo que a morena era ainda mais bela de perto. Ele se perguntou se ela ainda estava nua.

-Vocês não são daqui -  ela adivinhou.-O que estão fazendo nestas terras?

Colin se negou a responder. Não devia à mulher nenhuma explicação.  
Mas Dick, o traidor, estava encantado pela mulher e respondeu:

-Não tínhamos intenção de ofender ou incomodar, minha lady -  ele disse quando se recuperou de seu estado de choque.

-O asseguro. Ele sorriu, fazendo que seus olhos cor esmeralda dançassem de uma maneira que nunca falhava em seduzir as moças.

- Veja, somos simples mercadores, quer comprar algo? - Apontando pra suas mochilas.
Enquanto Dick a mantinha entretida, Colin ganhou vantagem de sua distração para deslizar sua mão lentamente pelo flanco de seu corpo e logo ao longo de sua panturrilha.  
Será que consigo tirar a adaga da bota? – Pensou Colin.

Dick levantou suas sobrancelhas em fingida inocência e seguiu falando.  – Para a dama, fazemos um bom desconto.

A espada subitamente se afundou na carne do pescoço de Colin, em violento contraste com a voz melodiosa da mulher, que disse:
-Espero que te esteja coçando a perna e não que esteja tratando de tirar algo da bota.

Ele apertou os punhos. Maldição! Ser ameaçado a ponta de espada por uma donzela! Por Jah! Era humilhante.

-O que quer?- ele grunhiu.
-O que quero? -  ela repetiu - Hmmmm. O que quero? -  Ela baixou a espada e golpeou a coxa de Colin irreverentemente com a espada. Mas antes que ele pudesse reagir, ela a moveu rapidamente de volta a sua garganta.

- Suas roupas.

Dick afogou sua risada.
Ela sorriu brandamente em resposta.
-As tuas também.
O sorriso de Dick se congelou em sua cara. 
-Quer que eu tire…?… toda a roupa?
-Sim.
A ira crescia em Colin.
 - Idiota!- disse ao Dick, que realmente parecia estar desfrutando da cena.
-Toma sua espada. Maldição, ela é só uma mulher, uma bebê. Vais ficar aí atirado como um…?
Dick riu.
– Ela já não é uma bebê, verdade, moça? Além disso, se a senhorita quiser minha roupa, Estarei encantado em obedecer.
Dick  ficou de pé, deixou cair seu cinturão, tirou-se suas botas, e começou a afrouxar os cordões de suas calças.
- Depois de tudo, é justo. Eu a espiei enquanto estava nua.
O entusiasmo de Dick enquanto se tirava as calças e a roupa interior só aumentou a irritação de Colin. Para sua surpresa, quando finalmente Dick se mostrava corajosamente ante ela, a mulher permaneceu indiferente a sua exibição de masculinidade.
Com a mão livre, ela recolheu o cinturão.
- Agora você - ela disse, cravando em Colin a ponta de sua espada.
Colin considerou que não o faria. Dick podia ter entrado naquele jogo, sorrindo como um idiota só coberto por sua túnica. Mas Colin estava certo a não conceder nada a uma mulher.
- Não -  ele disse.
 - Vamos - ela o apurou.  - É um pagamento justo por estar espiando.
- Não é um crime espiar aquilo que se exibe tão obscenamente - ele a repreendeu.
Ela já tinha ferido seu orgulho de cavalheiro. Ele não ia permitir ganhar a luta de vontades também.
A voz dela adquiriu um tom duro.  
– Tire a roupa, Já.
- Não -  ele disse também com um tom duro.
Apesar de que a espada nunca se moveu de seu pescoço, a mulher caminhou detrás dele, inclinando-se para lhe sussurrar no ouvido: - É perigosamente arrogante.
 Seu quente fôlego lhe produziu um calafrio que lhe percorreu o corpo, e a essência de sua pele recém-lavada era uma distração perigosa. Mas ele se negou a admiti-lo.
Com o silêncio dele, ela deu a volta para enfrentá-lo cara a cara, ela se agachou para estar diretamente em sua linha de visão. Colin não tinha outra opção, mas que olhá-la. O que viu fez que seu coração se acelerasse e que sua boca se secasse.
Graças a Jáh, ela já não estava nua, de outro modo a luxúria teria esmagado toda sua vontade. Ainda assim, sua fúria se derreteu instantaneamente, e era difícil para ele formar ideias, e muito menos emitir palavras.
Era bela, ele baixou seus olhos até o decote.
Ele respirou com dificuldade. Se ela tinha planejado desarmá-lo com sua beleza, era uma boa ideia. E funcionou até certo ponto. Mas enquanto ele continuava olhando sua formosa e feminina cara, ele se deu conta de uma verdade. Significativa. Apesar de toda sua bravura e palavras duras, ela era uma mulher. E o coração de uma mulher sempre era terno e compassivo.
A espada ameaçando sua garganta não era, mas que uma travessura. Ela nunca a usaria para machucá-lo. Não era mais perigosa que um gatinho.
-Não me cortará -  ele disse, desafiando seu olhar.
Ela franziu o cenho.  - Não seria o primeiro.
Colin não lhe acreditou por um instante.
Dick, preocupado pela séria mudança no intercâmbio de palavras, interrompeu com um sorriso.
-  ”Paz”, amigos. Não necessitamos que isto se converta em um assunto tão grave. Vamos,  tire a roupa como um bom moço, sim Colin?
Ela ficou de pé então - Sua roupa, Sr. Agora.
Colin estreitou seus olhos ante seu quadril, que estavam rodeadas por um pesado cinturão de cavalheiro que servia para sustentar a espada. O cinturão ia por cima de uma feminina saia vermelha.
-Não -  ele desafiou.
Um longo silêncio cresceu entre eles, carregando o ar como o vento antes de uma tormenta.
E então um raspou estalou. Foi tão inesperado e tão rápido que a princípio Colin não o sentiu.
- Santa Mãe de Jáh! - Dick murmurou assustado.
 Algo ardia no peito de Colin.
Era impossível, Impensável. Atônito, ele levou seus dedos ao lugar. Voltaram ensanguentados.
A moça o tinha talhado. A moça de cara doce, de voz suave,  tinham talhado sua carne.
Antes que ele pudesse recuperar-se para lançar um contra-ataque, ela levou a espada de volta a sua garganta, e ele foi forçado a agachar-se dobrado em dois como um animal ferido enquanto o sangue do corte superficial se escorria pela túnica rasgada.
Ele se tinha equivocado a respeito a dela. Estava completamente equivocado. Nenhum remorso suavizou seu olhar tranquilo.  Nada de piedade.  Nada de clemência. Poderia matá-lo sem pestanejar.
Nunca tinha visto tanta força de vontade em uma mulher. E só nos mais desumanos guerreiros tinha visto esse tipo de fria determinação. Ele impressionava e o enfurecia. Dobrado em dois, desamparado, olhando-a fixamente com ira silenciosa, não podia decidir o que sentia por ela, admiração ou ódio.
- Mãe de Jah -  Dick disse  - sabe o que fez?
Seu olhar nunca se desviou.  – Dei uma advertência.
- OH, minha lady -  Dick disse, sacudindo sua cabeça – Você provocou ao urso.
- É só um arranhão - lhe disse, estreitando seu olhar em Colin e adicionou - Para lhe recordar quem tem a espada aqui.
Colin sem deixar de olhá-la e permitindo um sorriso malicioso, adicionou:
 - Farei o que minha bela dama quer.

Por agora,. ele pensou. Mas em uns poucos dias, essa moça, teria o seu devido castigo por sua rabugice. 
(...)
Caminhava, desanimada, através do morro em direção ao lago.
Era uma bela paisagem, o gelo incrustado nas margens do lago. A neve emoldurava a água gelada em ambos os lados, cobrindo a terra de branco. 
Parada na margem, cruzei os braços sobre o peito, observava o lago. Quando vejo homens a cavalos entre as árvores, galopando na minha direção.
Corro ao longo da margem, sabendo que não tinha nenhuma chance de fugir. Gritei por socorro, com esperança que alguém pudesse ouvir e viessem ao meu socorro, mas uma bota choca-se contra minhas costas, fazendo-me cair na neve, o impacto foi com tal força que perdi o fôlego. Procurando ignorar a dor, tento me erguer para fugir.
Uma mão enrosca-se em meus cabelos e meu agressor puxa-me para trás e, em seguida, me joga de costas no chão. Vejo um grupo de cinco homens.
Tento enfrenta-los, mas não estou com a minha espada, nem com a minha adaga.

—O que vocês querem?— Eu grito.

O homem que segurava meus cabelos sorri. Furiosa, dou-lhe um soco. Ele grita de dor e cai para trás, dando-me a chance de fugir.
Mas não consegui ir muito longe antes que outro dos homens me jogasse novamente sobre a neve. O gelo encheu-me o nariz e a boca, uma dor latejante e intensa tomava todo o meu rosto.
Desta vez um segundo atacante acerta meu rosto com o punho. Fechando sua mão em torno do meu pescoço, apertando com força suficiente me impedindo de respirar.

—Pequena cadela— ele cuspiu.

Os outros homens reuniram-se próximos e então o primeiro atacante, com sangue escorrendo pelo arranhão que eu lhe tinha infligido.
Rasga o meu vestido, expondo meus seios. Lágrimas de raiva turvam minha visão.
O homem começou esbofetear-me, muitas vezes seguidas, sinto uma névoa de dor a me envolver. As mãos continuavam tateando meu corpo, manuseando e manipulando-me como a um animal.
Lágrimas quentes riscavam meu rosto dolorido. Nunca me sentira tão impotente em minha vida. Onde estava minha espada? Como iria me defender? Seria estuprada, incapaz de fazer qualquer coisa.
Jogam-me na neve, uma bota vem contra o meu estomago, sinto falta de ar.
Quando estava quase inconsciente, meu agressor inclinou-se sobre meu rosto e disse:
- Seu padrasto, manda lembranças. – Dando-lhe um tapa em meu rosto.

Os olhos de Clarie abriram-se bruscamente. Tremendo, olhou em volta. Demorou um instante para que percebesse onde estava. Cedera ao sono sentada em uma poltrona do quarto. Uma garrafa de brandy e um copo repousavam na mesinha ao lado da poltrona. Ela serviu-se da bebida, as mãos tremendo de tal forma que a garrafa batia na borda do copo, produzindo um som agudo.
Bebeu um, dois copos seguidos, enquanto tentava se acalmar. Impulsivamente pegou a garrafa e a lançou na parede, quebrando-a em vários pedaços.
Sabendo que logo, Samanttha entraria em seu quarto, perguntando o que aconteceu. Clarie pega sua capa, sua espada e sai do seu quarto, não tinha intenção de conversar com ninguém.
(...)
- Outra vez! - Clarie levantou seu braço e ordenou a Edmundo para que atacasse uma vez mais.
 
Ed investiu com um sorriso selvagem, e suas espadas se chocaram produzindo uma série de faíscas.
A violência era purificante, algo que lhe revitalizava, acalmava. Sem saber o motivo, o sonho que tivera a noite, tinha deixado ela irritada, como não tinha intenção de comentar a ninguém, tinha que se distrair para esquecer-lo.
O escudo de Edmundo chocou subitamente contra o de Clarie, sacudindo seus ossos. Clarie se equilibrou, devolvendo um golpe horizontal de sua espada que teria cortado a qualquer um pela metade. Mas Edmundo foi rápido. Saltou para trás, então e se agachou bem a tempo para ficar debaixo da espada de Clarie.
 
A-ha! - ele gritou, com a ponta de sua espada sobre o queixo de Clarie, seus olhos acesos com a vitória. 

A imagem daquele homem com quem sonhava, apareceu em sua mente outra vez e seu pulso começou a acelerar-se.

- Trabalha em sua velocidade, preguiçosa - Edmundo provocou, interrompendo seus pensamentos. – Você hoje está muito distraída, assim não terá diversão alguma em derrota-la.

As palavras do Edmundo ecoaram em sua alma. Pelas Deusas. O que lhe passava? Ela não era uma donzela frágil, boba e apaixonada. Ela era Heloise Clarice Ataide. Tinha açoitado ladrões, matado homens culpados ou inocente, domado feras e ferido bandidos. Não permitiria perder seu tempo com um sonho bobo.

A fúria esquentou suas bochechas. Empurrou a espada de Edmundo a um lado com seu escudo.

- Outra vez! – falou.

Faíscas explodiram quando suas espadas se chocaram uma vez mais. Edmundo girou e saltou, movimentava sua espada como se fora de brinquedo, mas o escudo de Clarie estava sempre ali para responder. Enquanto Ed mostrava todos seus truques, Clarie poderosamente rebatia os golpes com sua própria espada, mantendo longe a de Edmundo com sua força e uma crua determinação que não  permitia que fosse derrotada.
Mas não era Edmundo a quem ela procurava ganhar, a não ser os demônios que habitavam seus pensamentos.
Ela desviou a espada de Ed que ia para sua cabeça.
Ela avançou incansavelmente, golpeando a mão direita e sinistra em rápida sucessão, até que Edmundo estava contra a cerca.

-Heloise, Edmundo. – Samanttha os chamou ainda distante, fazendo Clarie abruptamente parar. 

Edmundo usou a distração para deslizar-se por debaixo da guarda de Clarie, para golpear as costas delas com o anverso de sua espada.
- Regra, numero um Clarie, nunca se distraia quando estiver em um combate. Estaria morta agora. – Disse Ed com um malicioso sorriso.

-Vocês não vão comer? - Falou Samanttha, parando a uma boa distância com suas mãos em seu quadril.
Clarie a ignorou, aproveitando a distração de Edmundo, investindo nos joelhos dele.
Edmundo saltou por sobre a espada e devolveu um golpe que se ela não tivesse agachado-se, teria arrancado a sua cabeça.
Samanttha fez cara de espanto, levando suas mãos ao rosto.
Ed rodou, então se arqueou e saltou ficando de pé outra vez, pronto para batalhar. 

-Parem.- Samanttha grita. 

Clarie bloqueou o próximo golpe de Ed. e ordenou sobre seu ombro.

-Volta para dentro, Samanttha.
-Mais já está na hora do jantar.
- Jantar? Clarie girou, então lançou um olhar ao o sol, estava baixo no céu. O tempo tinha pirado nesse dia.
- Sim - Samanttha disse – A horas vocês estão nisso. Logo vai anoitecer. -Sorrindo em seguida para Edmundo em busca de apoio.

Esse instante de distração lhe custou um pequeno corte na bochecha da espada de Clarie. Ele fez um gesto de dor, apertando os dentes.
- Cuidado com as distrações. – Soltou Clarie, com um sorriso no rosto.
Samanttha conteve a respiração.
-Talvez devêssemos entrar - Edmundo disse, abaixando sua espada.
Clarie, desde que se mudou pra Leiria tem sonhado todas as noites com algo que ocorrerá no passado, mais essa noite foi diferente, o sonho que tivera não tinha acontecido, e apesar de muito se esforçar em tentar reconhecer aquele rosto familiar, não conseguia dá um nome pra aquele homem.
Logo amanheceria, mais Clarie sabia que não iria conseguir dormir novamente, disposta a distrair-se com outra coisa, além daquele sonho, resolve sair em uma cavalgada matinal.

Horas depois, retorna pra casa, pega sua espada e a de Edmundo, sabia que o encontraria na mesa a desfrutar-se do seu desjejum.
Clarie entra no cômodo, e sem ao menos dá-lhes um bom dia, joga-lhe a espada a Edmundo, que rapidamente pega.

-Te espero lá fora. – Diz Clarie, dando-lhe as costas e caminhando para fora.

Edmundo olha para Samanttha, e logo a seguir para Amelie.

- Pelo visto, hoje ela está em pleno bom humor.

Samantha e Amelie, começa a rir, já estavam acostumadas com as alterações de humor de Clarie.

- Deixa eu ir, antes que a situação piore. – Diz Edmundo, pegando uma maça e dando-lhe uma mordida e se dirigindo para fora.

Edmundo tem um gênio difícil de lidar, pouco ambicioso. Suas ações implicam por vezes em atos mais frios e calculistas, mas isto não quer dizer que não é um bom homem, porém sempre seguia as vontades de seu Capitão. 
Moreno, 1,90 m, músculos bem delineados aos braços, caracterizados pelo trabalho braçal incessante, é dono de um olhar azul profundo que revela ter visto mais do que desejaria, com uma cicatriz horrível no rosto, na qual obteve ao salva a vida de Willians, o pirata mais conhecido como o “demônio vermelho ou o Capitão sem coração”, por ter a confiança extrema de Willians; Edmundo foi designado como “cão de guarda de Clarie”, com a desculpa de protegê-la. 

Clarie por sua vez, sabia que Willians, na realidade o escolheu para espantar qualquer um que tivesse a coragem e a intenção de cortejá-la e principalmente para informá-lo de todos os seus passos. Clarie, quase protestou, e passou em sua mente em matá-lo. Mas logo seus planos mudaram, ao notar que Edmundo tinha uma atração por Samanttha, e os seus sentimentos eram correspondidos pela mesma.

Edmundo ao contrario de Samanttha, não se metia nos “negócios” de Clarie, e nem a julgava por isso, o que fez ganhar rapidamente a sua simpatia.

Um sonho pertubador

Clarie bebe uma, duas, três, quatro, cinco copos de brandy seguidos, o álcool, melhorava o seu humor.
Sentada na poltrona com uma garrafa de brandy e um copo na outra mão, começou a sentir um forte calor lhe subir o corpo.

Seu sangue parecia estar fervendo.
“Não deveria beber tanto de barriga vazia” - Pensou Clarie. Enquanto desabotoava a camisola, agitou o corpete de modo que o ar pudesse penetrar por baixo do tecido e refrescar sua pele.

O calor continuou se espalhando por seu corpo e rosto. Fechou os olhos, ao abrir olhou ao redor, não reconheceu o ambiente, aquele não era seu quarto. Estava num longo corredor, com uma infinidade de portas de ambos os lados. Suas vistas estavam embaçadas.
Sabia que estava na sua casa, mas não reconhecia a ala onde se encontrava. Tinha portas demais e todas iguais. Atrás de qual delas chegaria ao seu quarto?
De repente, sentiu que seus braços e pernas pesavam como chumbo. Obrigou-se a caminhar, porém seus pés pareciam deslizar, até que, finalmente, conseguiu se apoiar em uma maçaneta.
Girou-a e espiou pela canto da porta. Estava em uma grande suíte, mas não era seu quarto. Curiosa, ela entrou e fechou a porta.
Olhou ao redor, e seu olhar parou-se na cama, que ficava no centro do quarto. Era imensa, com a cabeceira entalhada e quatro colunas sustentando um dossel ricamente bordado.
E um homem e uma mulher estavam se abraçando, pecaminosamente nus, sobre as colchas.
Clarie cogitou voltar atrás e sair antes que eles dessem por sua presença, mas continuou onde estava, hipnotizada. O homem estava deitado de costas e a mulher, ajoelhada na altura dos quadris dele. Ela era morena. Montava-o como em um cavalo, com graça e fluidez.
Apesar de estar escuro, Clarie tentou reconhecer a mulher. Ao estreitar os olhos, viu seu próprio rosto no lugar onde a mulher deveria estar.
Seria ela quem estava deitada naquela cama?... E Quem era o homem com quem compartilhava? 
Tinha a impressão de estar flutuando no ar como um fantasma.
Leve como uma pluma, Clarie recuou para as sombras e se concentrou no homem.
Ela não fazia ideia de quem era e, no entanto, ele lhe parecia familiar...
O casal executava uma dança sensual e elegante, como artistas a desempenhar seu papel. Seus corpos se alongavam e se contorciam, ondulavam e enrijeciam, enquanto seus membros os acompanhavam em movimentos coordenados.
As sensações que a inundavam a faziam acreditar que poderia ser ela a mulher sobre a cama.
Em certo momento, o homem a surpreendeu e sorriu.
"Venha para mim"- o estranho parecia dizer - "Deixe-me ser esse homem com quem sonha."
As carícias prosseguiram.
De repente, ela não conseguiu respirar. Ela fechou os olhos e quando abriu os olhos, o homem estava à sua frente, sem que soubesse explicar como.
E seu rosto estava cada vez mais próximo.
Fechou os olhos à espera de um beijo. Sentiu, no entanto, o roçar do tecido conforme ele afastava a camisola(...).  As carícias se tornaram mais intensas. Um gemido se fez ouvir.
Ela quis se afastar, incapaz de continuar suportando aquela doce tortura. Ao empurrá-lo, contudo, sentiu as mãos tocarem o vazio.
Clarie abriu os olhos. Estava em seu próprio quarto, em sua própria cama. Os lençóis amarfanhados e os travesseiros caídos no chão davam ampla evidência de seus sentidos alterados.
Algo havia acontecido. Um sonho ou um pesadelo?
Ao tentar se levantar, caiu para trás e precisou fechar os olhos novamente. Sua cabeça doía e seu coração batia tão forte. Tinha o corpo coberto de suor.
Ao olhar ao redor, sentiu um calafrio. O luar derramava formas escuras e fantasmagóricas sobre a penteadeira, e uma garrafa vazia se destacava nas sombras, com um reflexo brilhante.
Ao avistar a casa Samanttha correu ao encontro da porta de entrada, e sem cerimônias, entrou.
Samanttha, salvou a vida de Clarie, quando foi raptada por padres masoquistas, ao qual até hoje as duas carregam cicatrizes em suas costas, para lembrá-las das torturas que sofreram em nome de Jáh.

Samanttha é dois centímetros mais alta que Clarie, de cabelos loiros, lisos e muito claros, geralmente repleto de adorno como tranças, penas e tecidos. Possui olhos azuis, puxados para o anil. Uma mulher magra e de aspecto ágil, com seios poucos fartos. Com diversas cicatrizes espalhadas pelo corpo, no qual esconde com as suas vestes, deve ser por isso que se encantou pelo Edmundo e pela enorme cicatriz que carrega no rosto.
Samantha ao contrario de Clarie, é sempre sorridente, é muito difícil alguém tirá-la do sério. Calma, pode-se dizer até mesmo pacifista, vê o mundo de uma forma colorida. Ela é prestativa e inteligente, curiosa e liberta de quaisquer preconceitos da sociedade. Uma ótima ouvinte, por isso tornou-se a confidente de Clarie, embora seus conselhos poucas vezes sejam seguidos pela mesma.
Samanttha era meretriz e, por possuir conhecimento sobre vários tipos de ervas, foi considerada bruxa pela sociedade. Dessa forma, chamando a atenção dos padres masoquistas.


(...)

Logo em seguida, entrou a menina Amelie. Edmundo e Clarie ficaram para trás, ela parou de frente a porta, ele logo atrás.
- Não está curioso, Edmundo? – disse Clarie, sem tirar os olhos da porta.
- Não sofro dessa fascinação que as mulheres tem, uma cama confortável, pra mim basta. Qual será o meu quarto? – disse Edmundo franzindo a cicatriz.
- O primeiro ao subir as escadas, de frente com o da Samanttha.

Ao terminar de falar, Edmundo entrou na casa.
Entrando em seguida, viu Edmundo subindo as escadas, provavelmente ansioso em buscar sossego, em seus aposentos.
Na sala de visitas, encontrava-se Samanttha e Amelie, animadas, tirando os lençóis, para revelar as lindas mobílias.
Teriam muito trabalho aquelas duas, em deixar a casa limpa e arrumada. Mas, Clarie tinha certeza que o fariam de bom gosto.
Não querendo estragar a animação das duas, Clarie resolve fazer o mesmo que Edmundo refugiar-se no seu quarto.

O seu quarto é uma luxuosa suíte com cortinas marrons, tapetes vermelho-escuros e móveis em mogno fazendo do ambiente nada amistoso. Era o único cômodo da casa limpo e arrumado.
Ela tinha limpado e trazido todos os seus pertences de madrugada. Como não tinha conseguido dormir depois do pesadelo que tivera. Resolveu adiantar um pouco a mudança.

Clarie olhou pela janela, tinha a vista do mar, esse foi o motivo pelo qual escolheu aquele quarto. Perdida em seus pensamentos, mal notou o tempo passar, logo anoiteceria.
Bateram na porta.

- Entrem. – disse sem se virar, continuando a admirar o mar.
- Irá descer para o jantar? – Perguntou Samanttha.

Samanttha, era mais velha que Clarie, uns 6 anos, por isso sentia-se responsável por ela, mesmo sabendo que a mesma não gostava.

- Não tenho fome, o que achou da casa?
- De fato, a casa é bonita, o lugar é lindo, tirando o fato de ser longe da cidade e não termos vizinhos é um bom lugar para morar. Agora me diz, porque esta casa?
- Gosto do mar, e não quero vizinhos abelhudos, quanto menos pessoas saber sobre mim melhor. Aliás, essa casa foi uma barganha.



Samanttha fez menção de dizer mais alguma coisa, mas pensou melhor e conhecendo o gênio de Clarie resolveu sair do quarto.

A Casa do Penhasco

Depois de morar muitos anos numa cabana, caindo aos pedaços. Clarie finalmente consegue realizar seu sonho de comprar uma casa.

“A casa do Penhasco” assim denominada, tinha-se pago um bom preço, bem abaixo ao qual realmente valia, graças a fama de que era mal assombrada; isso simplesmente porque todos seus antigos moradores desapareciam ou morriam de uma forma inexplicável, entre outras histórias de que os antigos criados tinham visto e ouvido coisas que não sabiam explicar.
Clarie não acreditava em Jáh, anjos, demônios... Pior ainda em fantasmas. Não pensou duas vezes antes de adquirir a casa. A única coisa que tinha certeza, é que estava com muita sorte, tinha adquirido uma linda casa, num lindo lugar, perto do mar, era só descer o morro que tinha acesso a belas praias; quartos enormes no andar superior, todos com casa de banho, escritórios, copa, cozinha... A casa era um luxo, não conseguiria comprar uma casa do mesmo estilo, pelo valor que pagou.

De posses das chaves e da escritura, levou Edmundo, Samanttha e Amelie para conhecer a casa. Eles eram sua família. Para Clarie não importava ter laços de sangue, mais sim amor e confiança entre eles, apesar dela nunca ter demonstrado, eles sabiam que Clarie os amava.... Da forma dela.